
Contexto Global e Macro
Os problemas de saúde relacionados com a obesidade foram responsáveis por mais de 5 milhões de mortes a nível mundial em 2019. O aumento da prevalência da obesidade acarreta consequências tanto ao nível da saúde como económico, sendo que este último não tem sido devidamente explorado. Segundo a World Obesity Federation, é esperado que em 2030 uma em cada cinco mulheres e um em cada sete homens viverão com obesidade, isto é, um body mass índex (BMI) de 30 ou mais kg/m2, perfazendo cerca de mil milhões de pessoas a nível global.
De acordo com a organização, sem qualquer tipo de intervenção, o impacto socioeconómico do excesso de peso e da obesidade será substancial. Tendo em conta o aumento do nível populacional, bem como das distribuições de faixa etária, prevê-se que os custos globais com o excesso de peso e obesidade aumentem para mais de 3 mil milhões de dólares em 2030 e mais de 18 mil milhões de dólares até 2060. Este aumento de custos afetará especialmente países do grupo de rendimento médio-superior, tal como podemos observar pela Figura 1.
Figura 1 – Estimativa dos custos económicos entre 2019 e 2060, por grupo de rendimento
Fonte: World Obesity Federation, 2023.
Tendo em conta as tendências actuais, tais como alterações na dimensão da população, dos custos de cuidados de saúde bem como da solidez do sistema de saúde, dos custos prováveis da perda de produção tendo em conta as estruturas salariais e as taxas de emprego previstas para os diferentes grupos da população, prevê-se que em 2060 a grande maioria dos países tenha níveis de prevalência de excesso de peso e obesidade acima de 70% em toda a população (incluindo crianças).
Estes custos económicos incluem tanto os custos directos, decompostos por custos de cuidados médicos e sociais bem como custos indirectos, onde se incluem custos decorrentes de problemas de saúde e morte resultantes de doenças crónicas relacionados com a obesidade e a consequente perda de produtividade económica. Tal como a Figura 2 nos mostra, custos indirectos ou "invisíveis" para a economia são significativamente mais elevados do que os custos directos ou "visíveis".
Figura 2 – Repartição dos custos económicos da obesidade, por custos diretos e indiretos
Fonte: World Obesity Federation, 2023.
Estes custos para as economias globais, em 2020, variaram entre mais de 1% do PIB nos países do continente Africano e mais de 3% do PIB nos países do continente Americano. Até 2060, prevê-se que estes custos aumentem consideravelmente, variando entre mais de 2% do PIB nos países da região Africana, mais de 4% do PIB nos países do continente Americano e mais de 5% do PIB nos países do Médio Oriente. Prevê-se que em 2060, no total dos 161 países em foco, os custos económicos do excesso de peso e da obesidade excedam 3% do PIB mundial. Estes mesmos países poderiam poupar significativamente se as principais causas do aumento da prevalência do excesso de peso e da obesidade fossem atacadas.
Num cenário de abrandamento do aumento da prevalência do excesso de peso (e.g. uma redução de 5%), proporcionaria uma poupança anual média de cerca de 7% ou cerca de 430 mil milhões de dólares a nível global até 2060. Num segundo cenário, travar o aumento do excesso de peso e prevalência da obesidade aos níveis de 2019 até 2060, proporcionaria uma poupança anual de 23% em média ou cerca de 2,2 triliões de dólares a nível global até 2060.
Como é possível observar pela Figura 3, em 2060 a China será o país, a nível global com mais custos económicos do excesso de peso e da obesidade num total de cerca de 10,1 triliões de dólares o que representa cerca de 3,1% do PIB. Dos países seleccionados, os Estados Unidos da América aparecem em segundo lugar com 2,6 triliões de dólares correspondente a cerca de 4,6% do PIB. Destaque ainda para a Arábia Saudita com estes custos a representarem cerca de 5,6% do PIB no ano de 2060.
Figura 3 – Países cujos custos económicos do excesso de peso e da obesidade deverão exceder 100 mil milhões de dólares em 2060
Fonte: World Obesity Federation, 2023.
Dinâmica de Mercado
Os medicamentos para perda de peso tornaram-se um tema quente desde os finais de 2022, coincidente com uma já decorrente procura por soluções para a crescente epidemia de obesidade por parte das autoridades de saúde e as farmacêuticas. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), as taxas de obesidade mundial quase triplicaram na última década e actualmente estima-se que mil milhões de pessoas são clinicamente obesas, das quais cerca de 650 milhões são adultos, 340 milhões adolescentes e 39 milhões crianças.
A indústria de medicamentos para perda de peso encontra-se neste momento ancorada no já amplamente conhecido termo “GLP-1”, significa “Glucagon-Like Peptide-1” e é uma hormona produzida nos intestinos que desempenha um papel fundamental na regulação dos níveis de açúcar no sangue, na secreção de insulina e no apetite. Os agonistas dos receptores de GLP-1 (i.e. GLP-1 RAs) são uma classe de medicamentos utilizados para tratar a diabetes tipo 2 e a obesidade, imitando os efeitos desta hormona.
De acordo com o banco britânico Barclays, o GLP-1 poderá valer até 200 mil milhões de dólares de vendas na próxima década, com contribuição de cerca de 60% dos Estados Unidos, 26% da União Europeia e 16% do resto do mundo, tal como ilustra a Figura 4. Este crescimento global é maioritariamente impulsionado pelos EUA, tal como mostra a Figura 5. Estes prevêem que as vendas globais da Wegovy (Novo Nordisk) aumentam para $14bn em 2028 e de Mounjaro (Eli Lily) a aumentarem para $7.5bn em 2028. Mais conservadores, os bancos de investimento Citi e Morgan Stanley avaliam a indústria entre os 50 e 55 mil milhões de dólares até o ano de 2030.
Figuras 4 e Figura 5 – Divisão das receitas por fármacos / Divisão das receitas por região
Fonte: Barclays Research, 2023.
O banco de investimento Jefferies e a agência noticiosa Bloomberg vão um pouco mais além e preveem que as despesas globais com medicamentos para perda de peso aumentem dos 15 mil milhões de dólares registados em 2024 para 94 mil milhões de dólares até 2030 (ver Figura 6).
Figuras 6 – Vendas globais de medicamentos para perda de peso até 2030, por medicamentos Injectáveis ou Orais
Fonte: Bloomberg Intelligence, Jefferies, 2024.
As farmacêuticas Novo Nordisk e Eli Lily estão entre as que mais chamaram a atenção. O desenvolvimento e comercialização do Wegovy da Novo Nordisk acelerou uma mudança de percepção da obesidade como uma condição médica real, numa altura em que se entende existirem agentes terapêuticos eficazes. Segundo o Barclays, a maior fatia dos benefícios reverterá a favor dos dois primeiros líderes: Novo Nordisk e Eli Lilly. A Figura 7 ilustra essa mesma previsão até ao ano de 2028, com dominância clara da farmacêutica dinamarquesa.
Figuras 7 – Quota de mercado por fármaco em % vendas
Fonte: Barclays Research, 2023.
Com inúmeros concorrentes a tentarem conquistar o seu espaço neste mercado, os medicamentos para a obesidade estão a tornar-se um dos maiores e mais ferozes campos de batalha da história dos produtos farmacêuticos. Olhando apenas para os Estados Unidos, os próximos anos serão cruciais para perceber se a farmacêutica dinamarquesa Novo Nordisk conseguirá ser destronada (ver Figura 8).
Figuras 8 – Datas estimadas de lançamento de candidatos, nos EUA, a medicamentos para perda de peso
Fonte: Bloomberg Intelligence, 2024.