
No final de 2023 exprimimos a nossa apreensão acerca dos níveis historicamente baixos dos prémios de risco dos mercados accionistas e de dívida privada. Na nossa opinião, o risco não estava a ser devidamente remunerado, justificando uma posição particularmente selectiva, “combinando sectores mais growth, como a Tecnologia e a Segurança, com outros mais defensivos, como a Saúde e as Utilities”. Entre as obrigações, a nossa preferência recaía no segmento Investment Grade, nomeadamente “em emissões de Dívida Híbrida”.
Globalmente, esta avaliação revelou-se acertada. Em 2024, os “astros alinharam-se” e os mercados entregaram mais um ano de rendibilidades excepcionais, com os índices MSCI World e o Bloomberg Euro Corp ex-Fin Hybrid a valorizarem 26,2% e 12,2%, em EUR. Com efeito, a inflação diminuiu para perto dos objectivos oficiais, o crescimento económico revelou-se mais resiliente que o esperado, em especial nos Estados Unidos, os resultados das empresas acompanharam as expectativas e os Bancos Centrais começaram a cortar as taxas de juro.
Agora que 2025 se aproxima, continuamos a identificar vários desafios para as principais economias e mercados financeiros. A economia global é esperada crescer a bom ritmo e a inflação continuar a convergir para o objectivo dos 2% anual. Porém, os riscos geopolíticos não desapareceram. Pelo contrário, em certa medida até agravaram. Os conflitos no Médio Oriente e na Ucrânia continuam e as políticas anunciadas pelo Presidente-eleito dos Estados Unidos vêm adicionar mais incerteza, económica e geopolítica.
Global Economic Policy Uncertainty e Volatilidade (VIX)
Fonte: Bloomberg.
Conscientes dos riscos, contudo, também identificamos razões para optimismo: a temida recessão foi evitada e os Bancos Centrais vão continuar a descer as taxas de juro, suportando o crescimento económico e o investimento, em especial, em Tecnologia e Inteligência Artificial (IA), em Energia e em Segurança.
Assim, ponderadas as oportunidades e os riscos, em 2025, acreditamos que as rendibilidades de carteiras de investimento diversificadas, ainda que inferiores às observadas no último ano, continuarão a superar as dos tradicionais depósitos a prazo. Na nossa opinião, as avaliações dos activos com risco já descontam largamente as condições económicas e os resultados das empresas, e os baixos prémios de risco actuais aconselham alguma prudência. Alguma liquidez deverá ser reservada para aproveitar o eventual aumento da volatilidade nos mercados.
Mercados em 2024
Desde o início do ano, nos Estados Unidos, os índices S&P-500 e Nasdaq-100 registam valorizações de +25,1% e +23,5%, em USD, respectivamente. Em termos sectoriais, os ganhos foram liderados pelo sector Financeiro (+34,5%), seguido das empresas Tecnológicas (+33,9%), nomeadamente as ligadas aos temas da inteligência artificial e cloud, e Utilities (+27,9%). A dispersão de retornos foi particularmente elevada, com os sectores Healthcare e Materials a registarem ganhos de +5,5%, e +9,5%, respectivamente.
Rendibilidades – 2024 YTD
Fonte: Bloomberg. Cotações em 22-Nov-24.
Por sua vez, na Europa, os índices Stoxx-600 e EuroStoxx-50 ganharam +6,2% e +5,9%, respectivamente. Entre os principais mercados, destaque para o índice alemão DAX, com uma valorização de +15,3% e para o espanhol IBEX-35, com um ganho de +15,4%, desde o início do ano. A nível sectorial, destacaram-se pela positiva os sectores Bancário (+20,4%), Telecomunicações (+18,6%), e o Industrial (+14,1%), este último beneficiando do investimento em defesa e equipamentos industriais, num contexto de crescentes tensões geopolíticas. Pela negativa, destacaram-se os sectores da Alimentação e Bebidas (-10,7%) e Automóvel (-15,6%).
Entre os mercados emergentes (+6,2%, medido pelo índice MSCI Emerging Markets, em USD), os outperformers foram os mercados chinês (CSI-300 +10,4% USD) e indiano (S&P BSE Sensex, +7,9% USD). Pelo contrário, os underperformers foram os mercados brasileiro (IBOV, -19,7% USD) e o mexicano (MEXBOL, -27,3% USD), entre os principais.
Nos mercados obrigacionistas, o ano ficou marcado pela elevada volatilidade das yields da dívida soberana, em particular nos Estados Unidos. Com efeito, a resiliência da economia norte-americana e os receios quanto aos efeitos das políticas anunciadas pelo Presidente-eleito Donald Trump, nomeadamente na taxa de inflação e no stock de dívida pública, levaram a uma reavaliação quanto ao timing e dimensão dos cortes de taxas de juro pela FED e, consequentemente à subida das yields, durante o último trimestre do ano. Deste modo, os Treasuries a 2 e 10 anos terminaram o ano nos 4,37% e nos 4,40%, após as variações de +12 bp e +52 bp, respectivamente. Por seu turno, na Zona Euro, onde a economia está mais fraca, o BCE cortou três vezes as taxas de juro (colocando a taxa de juro para depósitos nos 3,25%) e as yields dos Bunds alemães a 2 anos desceram -41 bp para os 1,99%, e as yields a 10 anos subiram +22 bp para os 2,24%, respectivamente. Em ambos os blocos económicos as yield curves normalizaram (com yields superiores nos prazos mais longos), com os mercados a descontarem menores probabilidades de recessão e maior incerteza quanto à evolução da inflação no futuro.
Nos segmentos de dívida privada, apesar dos seus níveis reduzidos no início de 2024 e da incerteza geopolítica, os spreads de crédito encerram o ano com novos ganhos. Com efeito, os spreads do High Yield desceram 56 bp nos Estados Unidos, e diminuíram 71 bp na Europa, para os 301 bp e 328 bp, respectivamente. No segmento de Investment Grade, as descidas foram ligeiras, tendo os spreads estreitado para os 49 bp (-8 bp) e 58 bp (-1 bp), respectivamente. Deste modo, os índices globais de High Yield e Investment Grade valorizaram +8,8% e +1,5%, em EUR, desde o início do ano.
Spreads de Crédito (%)
Fonte: Bloomberg. Indices Bloomberg Barclays. Yields Corp Investment Grade.
Nos mercados cambiais, o ano foi de ganhos para o dólar norte-americano (USD) relativamente às principais divisas mundiais. Com efeito, o USD ganhou 6,0% contra o EUR, e 9,7% contra o JPY. Num contexto de reavaliação das expectativas para as taxas de juro futuras, o índice Dollar Spot valorizou 6,1%.
Outlook 2025
Conforme referido anteriormente, o ano de 2025 inicia-se num contexto de avaliações altas e prémios de risco historicamente baixos. Neste sentido, embora se perspective um ano de rendibilidades positivas, estas deverão ser inferiores às dos últimos anos, nomeadamente as do mercado accionista norte-americano.
Apesar de se identificarem razões para optimismo, como (i) a melhoria das perspectivas para o crescimento e a inflação globais, (ii) o impacto a longo prazo da IA na economia e (iii) as condições monetárias mais favoráveis nas principais economias, em larga medida, estes factores já se encontram descontados nas avaliações implícitas nos actuais níveis das Acções e do Crédito. Como tal, mantemos uma abordagem diversificada, combinando activos e sectores mais cíclicos com outros mais defensivos. Igualmente importante, mantemos alguma reserva de Liquidez para aproveitar o eventual aumento da volatilidade nos mercados para reforço de posições a níveis interessantes.
S&P-500: rendibilidade anual em períodos de 10 anos
Fonte: Bloomberg. Banco Invest.
Bancos Centrais
As perspectivas para o crescimento da economia mundial foram sendo revistas em alta ao longo do ano, ao mesmo tempo que a inflação nas principais economias foi convergindo para os objectivos dos Bancos Centrais.
Igualmente importante, as expectativas para a inflação futura, assumindo como proxy as taxas de juro forward 5Y5Y (taxas de juro a 5 anos, daqui a 5 anos), permanecem relativamente ancoradas perto do referencial dos 2%. Nos Estados Unidos, esta taxa de juro subiu nos últimos três meses, à medida que o mercado foi tentando avaliar o impacto das políticas económicas do Presidente-eleito (diminuição de impostos, aumento das tarifas comerciais e deportação de imigrantes) na taxa de inflação, mas ainda assim permanece em torno dos 2,5%.
Neste contexto, os Bancos Centrais deverão continuar suficientemente confiantes para manter a trajectória descendente das taxas de juro. Nos Estados Unidos, a Reserva Federal (FED), que durante 2024 cortou em 75 bp as taxas de juro, é antecipada realizar mais quatro cortes (de 25 bp cada), até ao final de 2025, para os 3,75%. De igual modo, na Zona Euro, o Banco Central Europeu (BCE), que ao longo do ano cortou igualmente em 75 bp, é esperado atingir os 1,75% em Outubro de 2025 (actual 3,25%).
Expectativas para a Inflação
Fonte: Bloomberg.
Apesar da mudança de políticas monetárias, as yields de longo prazo da dívida soberana norte-americana e alemã registaram subidas ligeiras face ao final do ano passado. Na nossa opinião, sobretudo após o movimento dos últimos meses (e do chamado Trump trade), existe valor na classe de activos, em particular nos prazos mais longos, tanto numa óptica de rendimento como de cobertura de risco (das acções) caso o desempenho da economia se revele mais fraco do que o actualmente esperado.
Taxas de juro dos Bancos Centrais
Fonte: Bloomberg.
Dívida Privada
Por sua vez, no segmento da dívida privada, mantemos a prudência manifestada ao longo dos últimos trimestres. Com efeito, na nossa opinião, o potencial para a continuação dos ganhos em dívida privada por via do estreitamento de spreads é bastante reduzido.
Ainda assim, uma vez que (i) as yields totais permanecem interessantes em termos históricos e relativos, e que (ii) os spreads de crédito continuam a descontar taxas de default muito superiores às históricas e às expectáveis nos próximos anos, mantemos a exposição à classe de activos mas, sobretudo, via obrigações com ratings Investment Grade, incluindo, de forma selectiva, emissões de Dívida Híbrida e Subordinada, e reduzimos a exposição no segmento de High Yield, onde a correlação entre os spreads e a volatilidade accionista é historicamente superior.
Spreads e Defaults implícitos
Fonte: Bloomberg, Banco Invest. Valores e cálculos em 25-Nov-24.
Mercados Accionistas
Após as fortes valorizações registadas em 2024 (MSCI World +26,1%, em EUR), as avaliações dos principais índices desenvolvidos encontram-se historicamente elevadas, descontando um cenário porventura demasiado benigno para a economia global.
Nos Estados Unidos, o índice S&P-500 transaciona com um múltiplo de 22,3x os resultados esperados para os próximos doze meses (Price-Earnings Forward 12M), contra uma média de 16,1x, desde 2006. Por sua vez, na Europa, as avaliações são menos exigentes, com o índice Stoxx-600 a transacionar com um múltiplo de 13,4x, ligeiramente acima da média histórica de 13,1x, no mesmo período. Ao mesmo tempo, em especial nos Estados Unidos, o mercado desconta um crescimento de resultados em 2025 (12,6%), que deixa muito pouca margem de manobra para desilusões.
Por outro lado, e até mais importante, quando incorporadas na análise as yields das obrigações soberanas, constata-se que os prémios de risco (por simplificação assumidos como o diferencial entre as Earnings Yields e as Bonds Yields) se encontram particularmente baixos, considerando o nível de incerteza que persiste a nível económico e geopolítico. Nos Estados Unidos, esta yield gap situa-se nos 0,2%, que compara com uma média histórica de 3,6%. Na Europa, o diferencial é maior (5,1%) mas ainda assim cerca de um desvio-padrão inferior à média histórica (6,1%).
Ou seja, a valorização dos mercados desde Outubro de 2023 resultou, em larga medida, da expansão dos múltiplos de avaliação, com as cotações das empresas a crescerem muito acima dos respectivos resultados, impulsionadas pela euforia dos investidores e analistas quanto a um cenário de soft landing económico e, entre outros, ao desenvolvimento da Inteligência Artificial.
Price Earnings e Risk Premiums
Fonte: Bloomberg, Banco Invest. Yield Gap – diferencial entre a Earnings Yield e a yield do Govt 10Y (proxy do prémio de risco).
Assim, 2025 inicia-se com avaliações historicamente altas, num cenário minado por vários riscos, desde as guerras em curso aos efeitos das políticas económicas de Donald Trump, passando pela debilidade da economia chinesa.
Contudo, como referido anteriormente, a economia mundial continua a crescer e os Bancos Centrais são esperados continuar a cortar as taxas de juro, suportando os mercados e o investimento em áreas que, na nossa opinião, permanecem interessantes e com potencial de crescimento.
Radar Sectorial
Fonte: Bloomberg, Banco Invest. ERP – Equity Risk Premium (prémios de risco).
Tecnologia e Inteligência Artificial
O índice tecnológico Nasdaq-100 valorizou 22,9% em USD, impulsionado pela euforia em torno da Inteligência Artificial (IA), entre outros. Apesar dos excessos em algumas das avaliações no sector, parece razoável assumir que o crescimento se manterá nos próximos anos.
Por um lado, os modelos de IA continuam a crescer a um ritmo elevado. Em 2021, os large language models (LLMs, um tipo de IA) respondiam correctamente a cerca de 10% dos problemas matemáticos. Em 2024, esta percentagem aumentou para os 90%[1]. Por outro lado, à medida que estes modelos se forem tornando mais baratos, o investimento das empresas, que até ao momento tem crescido ao ritmo anual de 2,5%, deverá igualmente aumentar e transversalmente a vários sectores, incluindo o sector público, onde a adopção desta tecnologia poderá traduzir-se em elevados ganhos de produtividade.
Saúde
O sector da Saúde, onde em média os custos com pessoal equivalem a 35% do volume de vendas, é um dos sectores onde a IA poderá ter um impacto significativo e rápido. A título de exemplo, alguns estudos referem que 65% das tarefas realizadas por trabalhadores no sector estão expostas a disrupção pela adopção da IA (por exemplo, na área dos diagnósticos). Por outro lado, no sector farmacêutico a IA é esperada aumentar a taxa de sucesso na aprovação de novos medicamentos. Actualmente, apenas cerca de 7% dos novos medicamentos chegam ao mercado; um aumento de apenas 5% na taxa de sucesso poderá significar mais 60 novos medicamentos e um aumento de 70 mil milhões de USD por ano nas vendas, nos próximos 10 anos[2].
Infraestruturas e Energia
Na nossa opinião, o investimento no sector da energia é esperado acelerar devido (i) à reindustrialização das economias mais desenvolvidas, nomeadamente dos Estados Unidos, (ii) à transição energética e maior procura por electricidade verde, e (iii) ao aumento da procura por data centers resultante, entre outros, da crescente adopção da Inteligência Artificial.
Este último factor é particularmente relevante. Nos Estados Unidos, que representam cerca de 40% do mercado global, o número de data centers regista um crescimento anual de cerca 25%. No primeiro trimestre de 2024, na Europa, América Latina e Ásia-Pacífico, o número de data centers registou um crescimento homólogo de 20%, 15% e 22%, respectivamente[3].
Por outro lado, o aumento dos data centers e da respectiva energia consumida, levará a um aumento do consumo de Água, para arrefecimento e fabrico de semicondutores. A nível global, o consumo de água pelos data centers é esperado crescer 6% por ano[4].
Outras áreas de interesse e com potencial de crescimento são a energia nuclear e as energias renováveis (a Agência Internacional de Energia estima que por cada 1$ investidos em energia fóssil, 2$ serão investidos em energias renováveis).
Segurança
O tema da segurança ganhou uma maior relevância, não necessariamente pelas melhores razões. Vários governos reavaliam as suas necessidades de investimento em segurança nacional, não só ao nível militar mas também ao nível de cibersegurança.
Outros sectores, como o Industrial, as Utilities e os Materials poderão beneficiar com esta tendência, por via do aumento da procura por mais energia, semicondutores, armamento e data centers.
Mercados Cambiais
Por fim, continuamos underweight no dólar norte-americano (USD), na medida em que a cotação do EUR/USD, na nossa opinião, permanece significativamente abaixo do nível (teórico) justificável, considerando a relação histórica entre a mesma e o diferencial de taxas de juro a 2 anos das duas moedas, mesmo admitindo que possa persistir um prémio de risco sobre a moeda europeia fruto da guerra na Ucrânia e do menor crescimento económico.
EUR/USD e Diferencial de taxas de juro a 2 anos

Fonte: Bloomberg, Banco Invest. Modelo de regressão linear entre o diferencial de taxas de juro a 2 anos e a cotação do EUR/USD.
Referências
[1] Jensen, G., Narayan, A., Simon L., (2024), Is an AI Bubble Ahead of US or Behind Us? Bridgewater
[2] Morgan Stanley (2022), Why Artificial Intelligence Could Speed Drug Discovery
[3] CBRE (2024), Global Data Center Trends 2024.
[4] Walsh, A. (2023), Behind the Data: Unveiling the Water Footprint of AI. Bluefield Research.