Nos últimos dez anos, o retorno total das obrigações europeias investment grade (obrigações com uma notação de crédito de pelo menos BBB-, consideradas como tendo um baixo risco de default) foi de 0,57%, o que se traduz num retorno anualizado de 0,06%.
Comparativamente, as obrigações corporate híbridas europeias tiveram um retorno total de 34,98% no mesmo período de tempo, resultando num retorno anualizado de 3,07%, 301 bps acima das obrigações sénior investment grade (Figura 1).
Figura 1 - Comparação de retornos a 10 anos entre um índice de obrigações Euro Corporate Híbridas e um de Euro Investment Grade
Investir em obrigações corporate híbridas tem por base a aquisição de títulos de dívida que, na estrutura de capital de uma empresa, se situam entre a dívida sénior e o capital próprio. Neste sentido, combinam características tanto de obrigações (eg. pagamento regular de cupões) como de acções (eg. maturidades muito longas ou perpétuas).
As obrigações corporate híbridas são emitidas maioritariamente por empresas cuja dívida sénior (títulos de dívida em que o credor tem prioridade de reembolso face a outros credores em caso de default) tem um rating de crédito investment grade. Estas obrigações são emitidas principalmente por empresas de sectores não financeiros (como serviços públicos, telecomunicações e energia, entre outros). A dívida subordinada do sector financeiro pode assumir a forma de “obrigações AT1” (Additional Tier 1 Bonds), Tier 2 Bonds, Contingent Convertible Bonds (CoCo), etc. e está sujeita a restrições regulatórias diferentes das obrigações corporate híbridas.
Sendo as obrigações corporate híbridas um tipo de dívida subordinada, posicionam-se abaixo da dívida sénior na estrutura de capital, mas acima do capital próprio da empresa em caso de default. Consequentemente, apresentam um maior risco de crédito que a dívida sénior, o que se reflete, regra geral, num rating inferior, mesmo sendo ambas emitidas por empresas classificadas como “investment grade”.
Esta estrutura permite aos investidores aceder a obrigações com um retorno (e perfil de risco) mais elevado do que a dívida sénior, mas com a segurança adicional de estarem associadas a emitentes financeiramente sólidos.
Como o nome indica, estas obrigações são híbridas, passíveis de serem convertidas em acções. Em caso de conversão, o investidor fica sujeito à volatilidade dos retornos do mercado accionista, perdendo a estabilidade dos pagamentos de cupões (risco de conversão). Outra característica importante é que as obrigações corporate híbridas (especialmente quando subordinadas perpétuas) são, regra geral, callable (passíveis de serem chamadas) antes da data de maturidade. No caso de uma queda das taxas de juro, o emitente pode chamar a dívida já emitida e emitir nova dívida a um custo mais baixo, sendo que, em caso de reinvestimento, o credor terá de comprar dívida com yields mais baixas. A dívida híbrida subordinada tem também inerente o risco associado ao facto de os cupões poderem ser adiados e acumuláveis, o que beneficia a empresa em caso de dificuldades financeiras, transferindo o risco para o credor. Este mecanismo reduz a probabilidade de default no curto prazo, mas aumenta a pressão financeira sobre a empresa no longo prazo, à medida que os cupões vão acumulando.
As yields das obrigações corporate híbridas encontram-se, de forma geral, entre as yields das obrigações investment grade e as obrigações high yield. Esta relação é evidenciada pelo nível de risco de cada tipo de activo. As obrigações investment grade são emitidas por empresas com um nível de risco de crédito reduzido e ratings de crédito altos, compensando o menor risco com um menor retorno. As obrigações high yield, tendo um risco de crédito mais elevado, e ratings de crédito consequentemente mais baixos, compensam o maior risco com uma yield mais alta. As obrigações corporate híbridas, encontrando-se num meio termo de risco entre high yield e investment grade, pelas caraterísticas acima descritas, oferecem um retorno intermédio entre ambas.
Para identificar esta relação, devemos observar o spread to swap dos vários tipos de obrigação previamente mencionados. O spread to swap refere-se à taxa que é oferecida acima da taxa de juro de referência (taxa swap, transacionada nos mercados interbancários).
Na Figura 2 podemos observar a evolução do investment grade spread to swap nos últimos 5 anos, actualmente nos 52 bps:
Figura 2 – Investment Grade EUR (spread to swap)
Por sua vez, o high yield spread to swap encontra-se nos 289 bps, 237 bps acima de investment grade (Figura 3):
Figura 3 – High Yield EUR (spread to swap)
E, de seguida, observamos o spread to swap das corporate híbridas, que se situa nos 171 bps, 119 bps acima de investment grade e 118 bps abaixo de high yield (Figura 4):
Figura 4 – Hybrids ex-Fin EUR (spread to swap)
Fonte: Bloomberg
Se compararmos o pico em 2022, esta relação mantém-se: investment grade à volta dos 140 bps, high yield perto dos 700 bps, e as corporate híbridas num intermédio entre ambas, nos 400 bps (e mantém-se, de igual forma, ao longo do período de 5 anos observado).
Por último, temos o AT1 spread to swap, ou seja, a dívida subordinada do sector financeiro, atualmente nos 278 bps, apenas 11 bps abaixo do high yield spread to swap, e 226 bps acima de investment grade (Figura 5):
Figura 5 – AT1 EUR (spread to swap)
O AT1 oferece yields mais elevadas do que as obrigações corporate híbridas devido ao risco inerente às obrigações do sector financeiro: no caso de AT1, a dívida encontra-se num rank inferior ao da dívida corporate híbrida e os cupões em vez de cumulativos e adiáveis, podem ser simplesmente suspendidos.
As obrigações subordinadas financeiras estão condicionadas por regulamentações e requisitos de capital de Basileia III (um acordo internacional que estabelece limites mínimos para o requisito de capital bancário, regulações de liquidez e leverage, stress tests, etc.), sendo influenciadas pela situação financeira do sector bancário e expostas a crises bancárias e riscos de bail-in (entre outros).
Em contrapartida, as obrigações corporate híbridas são principalmente condicionadas pelo mercado, e, em grande medida, influenciadas por características relacionadas com o risco de crédito e não necessariamente pelo risco regulatório – o risco de default das obrigações corporate híbridas depende da performance das empresas e não de intervenção governamental.
Resumindo, apesar de as AT1 bonds e as obrigações corporate híbridas serem ambas obrigações subordinadas, divergem no seu posicionamento na hierarquia da estrutura de capital, nos factores que determinam o risco de default e no enquadramento regulatório a que estão sujeitas. Enquanto as AT1 bonds estão dependentes das exigências de capital dos bancos e sujeitas a mecanismos de absorção de perdas de capital, as obrigações corporate híbridas são predominantemente influenciadas pelas características de crédito das empresas e não estão sujeitas ao mesmo nível de intervenção.
O investimento em obrigações subordinadas, seja corporate híbridas ou subordinadas financeiras (AT1), pode constituir uma oportunidade atractiva de diversificação da componente obrigacionista de uma carteira de investimento, sustentada por uma combinação de factores, como as yields mais vantajosas que o segmento investment grade apresenta e o potencial de valorização de preço no caso de uma melhoria da qualidade do crédito da empresa emitente.
No caso das corporate híbridas beneficia-se ainda do facto de a dívida ser emitida, regra geral, por empresas com ratings investment grade na sua dívida sénior, com boa qualidade de risco de crédito, e que emitem este tipo de obrigações (subordinadas), mais “caras” do que as séniores, de forma a obterem uma maior flexibilidade na sua estrutura de capital. Com efeito, as obrigações híbridas “contam” como capital, mas são mais baratas do que a emissão de acções.